1256: Aviso Amarelo no Algarve
Faro
Última actualização da informação:
Sábado, 5 de Março de 2011
Amarelo | Precipitação Para o período de: 2011-03-05 23:00:00 |
Chuva/Aguaceiros Aguaceiros, por vezes fortes e acompanhados de trovoada. |
Fonte: IM
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Faro
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Chuva/Aguaceiros Aguaceiros, por vezes fortes e acompanhados de trovoada. |
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O Plano de Pormenor da Praia de Faro prevê a demolição de 185 casas na zona concessionada à autarquia. De pé ficam apenas 80.
O Observatório do Algarve apurou que o Plano de Pormenor elaborado para a zona da Praia de Faro desafetada do Domínio Público Marítimo, área gerida pela Câmara Municipal de Faro, prevê que apenas fiquem de pé 80 construções.
Na área a nascente da ilha e do lado do mar, está prevista a demolição de 131 casas, ficando exclusivamente de pé os três maiores edifícios.
Na área a poente, vão abaixo 54 construções, ficando de pé apenas cinco, três das quais são prédios de quatro pisos. Entre os edifícios a demolir estão sinalizados os restaurantes Camané e Paquete.
A estas demolições acrescem as que já estavam previstas na zona de Domínio Público Marítimo, que são consideradas construções clandestinas.
Estes números, apurados pelo Observatório do Algarve, não foram confirmados pela Sociedade Polis Litoral da Ria Formosa.
Valentina Calixto, presidente da Sociedade Polis Litoral da Ria Formosa apenas confirmou que o número de casas a demolir já está apurado, todavia recusou-se a adiantar quantas são.
“Claramente que temos o número identificado, mas o detalhe do projeto é que vai ajustar esse número”. A responsável refere-se à construção de uma duna 'gigante' que visa proteger as zonas lagunar e continental, como o aeroporto e a baixa da cidade de Faro, de um possível galgamento do mar, em consequência de temporais.
“Não estamos a falar de uma renaturalização total. Estamos a falar sim de uma zona de intervenção que conflitua não só com a edificação, mas também com a estrada existente, ou seja, vamos ter de relocalizar nalguns pontos a estrada”, sublinhou.
A presidente da Sociedade Polis Litoral da Ria Formosa falou com o Observatório do Algarve à margem do encontro “Conversas na Ria”, que decorreu no dia 3 de março, em Tavira.
Valentina Calixto explicou que o risco existente naquela zona era conhecido, todavia os estudos efetuados no âmbito da elaboração do Plano de Pormenor vieram a revelar que atinge "um nível preocupante”.
“Os estudos, que estão concluídos neste momento, adiantam que a Praia de Faro é uma área de grande risco de galgamento, que em qualquer altura de grande tempestade poderá provocar danos não só na ilha, mas no espaço lagunar e espaço continental envolvente”, alertou.
A presidente da Sociedade Polis acrescentou que a solução técnica proposta para reduzir o risco de galgamento passa pela construção de uma duna em toda a extensão da Península do Ancão, o que implica a demolição de construções existentes também na zona de desafetada do Domínio Público Marítimo.
A duna terá “uma altura e uma extensão para o lado do mar, por forma a criar robustez ao cordão dunar, que permita que o mar encontre ali uma força que impeça que ele consiga destruir toda a zona de ilha”.
Realojamento fora da zona desafetada
A presidente da Sociedade Polis declarou também que, ao contrário do que estava previsto, o realojamento das famílias com primeiras habitações na Praia não será feito na zona desafetada do Domínio Público Marítimo.
“Preferencialmente pensava-se que o realojamento das primeiras e únicas habitações da zona do domínio público deveria fazer-se também na zona desafetada, mas por situações de risco o Plano de Pormenor desaconselha isso”, disse e sublinhou que não será possível retirar totalmente o risco daquela área, apenas minimizá-lo.
De acordo com Valentina Calixto, as soluções serão encontradas em articulação com a Câmara Municipal de Faro, entidade responsável pela gestão daquele território em particular.
Novos trabalhos ultrapassam orçamento
Os novos trabalhos programados para a Praia de Faro vão ultrapassar o orçamento inicial numa verba que Valentina Calixto estima que ultrapasse os 15 milhões de euros, quando o inicialmente previsto rondava os 6 milhões de euros.
“Estamos a falar em relocalização de infraestruturas, uma duna reconstruída, edificações algumas em que os lotes foram vendidos e as casas construídas legalmente, há que indemnizar essas habitações”, exemplificou.
Para já a responsável não acredita que seja ultrapassado o prazo definido para a execução do Polis Litoral da Ria Formosa, que deverá estar concluído até ao final de 2012, com possibilidade de prolongar por mais 6 meses.
Contudo, Valentina Calixto salienta que estão perante novas exigências e essa avaliação temporal só pode ser efetuada com o avançar do projeto.
“O risco existia e era conhecido, mas nunca pensámos que fosse necessária esta solução e tanta intervenção para minimizar o risco”, concluiu.
Comissão Específica reúne a 17 de março
As conclusões e soluções apresentadas no Plano de Pormenor da Praia de Faro vão ser discutidas numa reunião da Comissão Específica, agendada para 17 de março.
A Comissão, criada por despacho ministerial no âmbito do Plano de Ordenamento da Orla Costeira para acompanhamento dos trabalhos a realizar nas ilhas barreira, é composta por todas as entidades com competência no território. A reunião incluirá ainda as associações que representam a Praia de Faro. A todos os envolvidos foi já entregue uma cópia do documento que irá ser discutido.
Fonte: Observatório do Algarve
O «barlavento» termina aqui, com esta terceira parte, a evocação dos estragos causados no Algarve pelo ciclone que atingiu o país há 70 anos, no dia 15 de Fevereiro de 1941.
Como seria de prever, o ciclone atingiu fortemente as ilhas barreira da Ria Formosa: «Na ilha da Culatra desapareceram muitas barracas de pescadores, que se dirigiram ao departamento [Marítimo do Sul] a pedir providências. Os marítimos das ilhas perderam os seus barcos e os apoios de pesca. Os ilhéus foram vacinados, devido a terem aparecido doentes atacados de varíola. A barca do porto comum foi parcialmente destruída».
«Há, porém, um facto que sobreleva todos os outros: A destruição da aldeia da ilha Ançã [Ancão – Praia de Faro], da qual nem destroços restam. Ondas gigantescas, de altura inconcebível, invadiram de súbito a pequena língua de terra. Nada podia resistir-lhes. Casas, redes, pequenas embarcações, o arraial da armação da pesca de atum «Cabo de Santa Maria» - tudo foi reduzido a migalhas num abrir e fechar de olhos. E logo outras vagas arrastaram os restos daquilo, que momentos antes, fora uma povoação de gente humilde e laboriosa, agora lançada na mais negra e desoladora das misérias».
Ao todo, mais de cem pessoas, entre homens, mulheres e crianças, foram atingidos pela catástrofe, na hoje designada Praia de Faro.
«Próximo da ilha Ançã e junto do ilhote de Coleiros, a fúria do mar teve um efeito surpreendente: apareceu uma nova barra».
Na Fuzeta, «parte da povoação foi invadida pelo mar. Ficaram inundadas centenas de habitações». «Os prejuízos nas embarcações são elevados. A ria está assoreada, pelo que é impossível o tráfego».
Os pescadores perderam ainda todas as teias de alcatruzes utilizadas na pesca do polvo. Na mesma localidade, tal como em Moncarapacho e Pechão «há milhares de oliveiras derrubadas».
Por sua vez, em Vila Real de Santo António, «os campos sofreram uma razia, não ficando, em muitos pontos, uma árvore de pé. No rio afundaram-se numerosas embarcações, outras ficaram destruídas e ainda outras desapareceram. As canoas dos irmãos Jacinto e José Barão e do Sr. José Marques foram tragadas pelas águas, assim como os respectivos carregamentos de café e açúcar. Um «gasolina» da Empresa de Transportes do Guadiana ficou despedaçado. No local conhecido por Lasareto, as casas velhas ruíram. Abateram telhados e paredes nas fábricas de Sanches e Barroso, Raul Folques, Sales, Ramirez, Aliança e Paródi. (…) Na vila, o tanoeiro António Segura Rodrigues foi projectado de encontro a uma parede sofrendo fractura nos maxilares. (…) Na avenida da Republica o vento levou as guaritas da Guarda-Fiscal».
«Na secretaria da Câmara Municipal, todas as janelas ficaram estilhaçadas. Correram perigo os funcionários e algumas pessoas que ali se encontravam, chegando a esboçar-se o pânico. Embora sem gravidade, há pessoas feridas com os estilhaços dos vidros».
«Por todo o lado há candeeiros de iluminação destruídos, postes telegráficos e telefones derrubados – o que tem impedido as comunicações com o resto da província e nomeadamente a capital – casas destelhadas, empenas caídas e árvores arrancadas. A caminho de Castro Marim o aspecto é ainda mais desolador. Toda a margem de terrenos cultivados alagaram-se, estando completamente inutilizadas as sementeiras de cevada, trigo e fava. A água subindo em verdadeiras cortinas, avança na parte baixa da vizinha cidade espanhola de Ayamonte, inundando-a completamente. Devem ser importantes os estragos ali ocorridos. Na povoação espanhola de Canelas caiu parte do campanário duma igreja».
Na velhíssima cidade de Tavira, «contam-se às dezenas os prédios que sofreram prejuízos. Na fábrica de moagem de J. A. Pacheco, o vento levou grande parte da cobertura, o mesmo sucedendo no armazém contíguo à moagem da firma Araújo Ribeiro & Dias. Na fábrica de conservas Balsense e na casa do salva vidas também abateram os telhados».
Também em Tavira, «o Bairro Jara habitado por gente pobre foi atingido gravemente, havendo moradias que ficaram destelhadas e em ruínas. Na bacia das Quatro Águas uma barca da Companhia de Pescarias Algarve, denominada Moagem, foi ao fundo, carregada de sal. Os batelões da mesma companhia que estavam junto do rio, que corre paralelo à costa foram atingidos pelas vagas, afundando-se. Na ilha de Tavira a água do mar juntou-se à do rio, pondo em sério risco o arraial da armação daquela empresa. A maioria das cabanas existentes na ilha foi levada pela corrente. No campo, milhares de árvores foram destruídas [No sítio das Cabanas, um olival, de que é proprietário o Sr. José Chagas, de cerca de trezentas árvores, só oito ficaram de pé]. Não há comunicações. A camioneta que faz a carreira diária entre a cidade e a vila de Alportel foi atingida por uma árvore».
«No sítio da Fortaleza, junto da armação do atum, o mar abriu nova barra de grande extensão» Na freguesia da Luz, «até a erva foi queimada pelo vento».
Reconstrução e situação atual
Os prejuízos totais na região foram contabilizados, dias depois do ciclone e segundo o «Diário de Notícias», em 50 000 contos (aproximadamente 250 mil euros, mas que, a valores atuais, ascenderiam a mais de 10 milhões de euros). A economia do Algarve ficou fortemente afectada e os mais pobres duramente atingidos, tanto mais que «as sementeiras de fava e ervilha, que constituem uma grande riqueza do Algarve e a base de alimentação das classes menos abastadas nesta quadra, podem considerar-se perdidas».
Mas os algarvios não se detiveram perante tão grande adversidade. Foram vários os gritos de socorro às entidades, emanados através dos jornais, como em Salir: «Centenas de camponeses, olhos rasos de lágrimas procuraram o correspondente do Século e pediram-lhe que, por intermédio do nosso jornal, se solicitassem providências ao Governo».
Até em Lisboa «uma comissão de estudantes algarvios, de várias Faculdades», coordenados por Maria Odete Leonardo, resolveu «recolher donativos para acudir aos seus conterrâneos».
António Graça Mira, contemporâneo aos acontecimentos, recorda ainda os cortejos de ofertas, que se realizaram um pouco por toda a região, bem como o imposto de um tostão, ambos destinados ao auxílio das vítimas.
O Carnaval de 1941, cujos festejos ocorreram a 25 de fevereiro, foi bastante discreto em todo o território. Mas em Loulé e em exceção, o corso saiu à rua, ou não se destinassem as suas receitas a apoiar o funcionamento do Hospital da Misericórdia.
A liderar o processo de restabelecimento do país esteve um algarvio, o louletano Eng. Duarte Pacheco, que à época ocupava o cargo de Ministro das Obras Públicas e Comunicações. O seu empenho e a pronta ação foram meritórios, permitindo normalizar “rapidamente” o país após tão pesada calamidade.
Em Portimão, data desta época a construção do bairro do Pontal, precisamente para alojar as famílias pobres que viram as suas casas e barracas destruídas pela violenta tempestade.
O ciclone marcou duramente a paisagem do Algarve, muitas árvores centenárias desapareceram e hoje dificilmente se imagina, por exemplo, a estrada de Faro a Olhão ladeada de eucaliptos. Interessante é constatar como a economia algarvia se transformou tanto nas últimas décadas.
Atualmente, já não seriam destruídos barcos carregados de esparto, de conservas, ou mesmo de açúcar. A freguesia de Pêra já não abastece Lisboa de favas ou ervilhas, e nem haveria no Algarve chaminés de fábricas de conservas, ou mesmo de cortiça, para derrubar. A produção de amêndoa, à época tão importante na economia regional, é hoje residual.
Mas o quotidiano e os hábitos dos algarvios também se modificaram substancialmente. Em Alte, como em toda a região, já não se cozinha com a água das goteiras, nem as favas e os griséus são a base da alimentação, ou exclusivas desta quadra.
Como se comportariam hoje os prédios da Praia da Rocha perante um ciclone? Ou todos os outros prédios por esse Algarve fora? É algo que devemos equacionar.
Afinal hoje, tal como ontem, não estamos livres dos efeitos de um novo ciclone extra-tropical.
Outras tempestades têm fustigado Portugal e o Algarve nos últimos 70 anos, mas felizmente nenhuma outra atingiu a destruição vivida pelos nossos avós, como a causada pelo ciclone de 15 de Fevereiro de 1941.
Bibliografia: Jornais «O Século» e «Diário de Notícias» de fevereiro de 1941 e Conta de Gerência do Município de Portimão de 1942 (gentilmente cedida pelo Centro de Documentação do Museu de Portimão)
*Investigador de História Local e Regional
4 de Março de 2011 | 23:43
Aurélio Nuno Cabrita*
Fonte: Barlavento Online